A Sinfonia da Identidade: Como a música da adolescência molda o caráter dos nossos filhos
O meu apreço pela música não é segredo para ninguém que me conhece minimamente. Sempre cito-a em meus escritos, aulas ou mesmo, quando compartilho minhas estatísticas do que escutei ao longo dos últimos doze meses – obrigado Spotify! Entre os mais de 70.000 minutos médios anuais que escuto, não há uma única atividade do meu dia a dia em que eu não esteja escutando uma música. Ela embala momentos pessoais, familiares, profissionais, servindo, por vezes, como bálsamo entre os desafios do cotidiano. Mais recentemente, passei a observar que esse meu hábito vem sendo, pouco a pouco, absorvido pelos meus filhos, especialmente minha filha mais velha, que agora chega aos 12 anos de idade e entra na pré-adolecência. Meu filho mais novo, por outro lado, tem 7 anos e parece começar a perceber que a música pode ser sua aliada, especialmente para ajudá-lo com suas emoções. Ambos possuem suas listas musicais, as quais compilam diferentes estilos e artistas, dando o tom de que a descoberta das suas preferências e como as diferentes músicas os influenciam, está em andamento.
De fato, a música transcende o mero entretenimento, atuando como um poderoso arquiteto da identidade humana. Desde os primórdios da civilização, ela tem sido um veículo para expressar emoções, transmitir valores e construir laços sociais. Mais recentemente, passei a me interessar ainda mais sobre como a música age sobre nós. Até que recentemente, tive acesso a alguns estudos bastante interessantes sobre a capacidade da música de evocar memórias e despertar sentimentos. Um desses estudos, conduzidos pelo Dr. Daniel Levitin, da McGill University, revelou detalhes impressionantes sobre a correlação entre a música, nossos sentimentos e personalidades. Conforme ele observou, há uma relação direta entre a música e experiências pessoais e essa conexão é especialmente forte durante a adolescência, um período crucial para a formação do caráter e da identidade. As músicas que embalam essa fase da vida deixam uma marca indelével no cérebro, moldando nossas preferências musicais e influenciando nossas emoções ao longo da vida [1].
A adolescência, com sua turbulência emocional e busca por identidade – estou vivendo isso na pele com minha filha mais velha, além de ter muito vívida as lembranças de quando eu mesmo passei por essa fase – é um terreno fértil para a formação de laços profundos com a música. Durante essa fase, o cérebro está em constante desenvolvimento, criando novas conexões neurais e estabelecendo padrões que perdurarão por toda a vida. As músicas que ressoam conosco nessa época se tornam trilhas sonoras de nossas experiências, emoções e memórias, criando uma conexão profunda e duradoura [2]. A intensidade das emoções vivenciadas na adolescência, combinada com a maleabilidade do cérebro em desenvolvimento, torna esse período especialmente propício para a formação de associações fortes e duradouras entre a música e a memória.
A pesquisa de Levitin nos convida a refletir sobre o poder da música na formação do caráter, especialmente na vida de nossos filhos. Em um mundo cada vez mais dominado pela tecnologia e pela cultura de massa, a música se torna uma ferramenta ainda mais importante para a construção de valores e a transmissão de conhecimento. Ao compreendermos o poder da nostalgia musical, podemos usar essa ferramenta de forma consciente e responsável, guiando nossos filhos na construção de um futuro mais positivo e significativo.
Uma dessas descobertas aponta que as músicas que ouvimos entre os 12 e 15 anos ativam uma reação em cadeia nas áreas de emoção do nosso cérebro, deixando uma marca indelével em nossa memória [2]. Outra conclusão importante que o estudo aponta é que o ápice da nostalgia musical ocorre por volta dos 17 anos, quando as músicas que ouvimos deixam uma marca emocional permanente nas nossas memórias e personalidades [3]. As músicas da adolescência ativam áreas do cérebro responsáveis pelas emoções, criando associações fortes e duradouras, não apenas com as experiências vividas naquele período, mas como responderemos a situações semelhantes em outros momentos das nossas vidas. Um outra descoberta relevante é que após os 30 anos, a nossa capacidade de formar novas conexões emocionais profundas com a música diminui gradualmente [4]. É por esse motivo que ao revisitarmos músicas que nos marcaram, será menos comum encontrarmos em nossas memórias músicas que não precedam esse período das nossas vidas.
Podemos usar a nostalgia musical de forma consciente para regular nossas emoções, “hackeando” o nosso sistema, para, por exemplo, aumentar o nosso bem-estar e até mesmo melhorar o desempenho cognitivo [7]. Um outro ponto é que há uma validação legítima da nossa nostalgia quanto ao nosso sistema de preferências. A sensação de que "a música antiga era melhor" não é apenas saudosismo, mas sim, uma resposta neurológica real, comprovada pelo estudo de Levitin, especialmente por essa correlação marcante entre as experiências musicais vividas no nosso período de adolecência [8].
Descobertas como essa apontam a importância do nosso papel como pais e como esse aspecto – a música, até então, costumeiramente vista como entretenimento, e nossas preferências, como casualidade e resultados aleatórios do destino, podem permear características mais profundas da nossa personalidade. Estudos como esse revelam um atributo adicional da nossa responsabilidade de guiar nossos filhos na escolha das músicas que consomem, dado que elas podem – e, eventualmente irão – influenciar sua visão de mundo e seus valores.
A música pode ser usada como uma ferramenta educacional poderosa, transmitindo valores positivos, ensinando sobre história e cultura, e promovendo o desenvolvimento emocional e social. Expor nossos filhos a uma variedade de gêneros musicais pode ampliar seus horizontes, estimular sua criatividade e promover a tolerância e o respeito pela diversidade cultural. As músicas que nossos filhos ouvem hoje, por outro lado, serão as trilhas sonoras de suas vidas, moldando suas memórias e influenciando suas emoções no futuro. Ao compreendermos o poder da nostalgia musical, podemos usar essa ferramenta de forma consciente e responsável, guiando nossos filhos na construção de um futuro mais positivo e significativo.
[2] Janata, P. (2009). The neural architecture of music-evoked autobiographical memories. Annals of the New York Academy of Sciences, 1169(1), 193-198.
[3] Krumhansl, C. L. (2011). An exploratory study of musical memories and emotions across the lifespan. Psychology of Music, 39(3), 339-363.
[4] Lamont, A. (2011). Musical identities in adolescence. In Musical identities (pp. 71-88). Oxford University Press.
[5] Juslin, P. N., & Västfjäll, D. (2008). Emotional responses to music: The need to consider underlying mechanisms. Behavioral and brain sciences, 31(5), 1 559-575.
De fato, a música transcende o mero entretenimento, atuando como um poderoso arquiteto da identidade humana. Desde os primórdios da civilização, ela tem sido um veículo para expressar emoções, transmitir valores e construir laços sociais. Mais recentemente, passei a me interessar ainda mais sobre como a música age sobre nós. Até que recentemente, tive acesso a alguns estudos bastante interessantes sobre a capacidade da música de evocar memórias e despertar sentimentos. Um desses estudos, conduzidos pelo Dr. Daniel Levitin, da McGill University, revelou detalhes impressionantes sobre a correlação entre a música, nossos sentimentos e personalidades. Conforme ele observou, há uma relação direta entre a música e experiências pessoais e essa conexão é especialmente forte durante a adolescência, um período crucial para a formação do caráter e da identidade. As músicas que embalam essa fase da vida deixam uma marca indelével no cérebro, moldando nossas preferências musicais e influenciando nossas emoções ao longo da vida [1].
A adolescência, com sua turbulência emocional e busca por identidade – estou vivendo isso na pele com minha filha mais velha, além de ter muito vívida as lembranças de quando eu mesmo passei por essa fase – é um terreno fértil para a formação de laços profundos com a música. Durante essa fase, o cérebro está em constante desenvolvimento, criando novas conexões neurais e estabelecendo padrões que perdurarão por toda a vida. As músicas que ressoam conosco nessa época se tornam trilhas sonoras de nossas experiências, emoções e memórias, criando uma conexão profunda e duradoura [2]. A intensidade das emoções vivenciadas na adolescência, combinada com a maleabilidade do cérebro em desenvolvimento, torna esse período especialmente propício para a formação de associações fortes e duradouras entre a música e a memória.
A pesquisa de Levitin nos convida a refletir sobre o poder da música na formação do caráter, especialmente na vida de nossos filhos. Em um mundo cada vez mais dominado pela tecnologia e pela cultura de massa, a música se torna uma ferramenta ainda mais importante para a construção de valores e a transmissão de conhecimento. Ao compreendermos o poder da nostalgia musical, podemos usar essa ferramenta de forma consciente e responsável, guiando nossos filhos na construção de um futuro mais positivo e significativo.
O período crítico da adolescência
A adolescência é um período de muita turbulência emocional, especialmente por ser a fase da nossa vida em que estamos buscando consolidar nossa identidade. Igualmente, é um período determinante para a formação de nossas preferências musicais. Durante essa fase, o cérebro está em constante desenvolvimento, criando novas conexões neurais e moldando nossa identidade. O estudo de Levitin revela alguns dados surpreendentes.Uma dessas descobertas aponta que as músicas que ouvimos entre os 12 e 15 anos ativam uma reação em cadeia nas áreas de emoção do nosso cérebro, deixando uma marca indelével em nossa memória [2]. Outra conclusão importante que o estudo aponta é que o ápice da nostalgia musical ocorre por volta dos 17 anos, quando as músicas que ouvimos deixam uma marca emocional permanente nas nossas memórias e personalidades [3]. As músicas da adolescência ativam áreas do cérebro responsáveis pelas emoções, criando associações fortes e duradouras, não apenas com as experiências vividas naquele período, mas como responderemos a situações semelhantes em outros momentos das nossas vidas. Um outra descoberta relevante é que após os 30 anos, a nossa capacidade de formar novas conexões emocionais profundas com a música diminui gradualmente [4]. É por esse motivo que ao revisitarmos músicas que nos marcaram, será menos comum encontrarmos em nossas memórias músicas que não precedam esse período das nossas vidas.
A Neurociência da Nostalgia: Uma ferramenta para a formação do caráter
A nostalgia musical não é apenas uma questão de preferência pessoal, mas sim, um fenômeno neurobiológico. Nosso cérebro é programado para valorizar as experiências passadas, e as músicas da adolescência se tornam parte integrante de nossa identidade [5]. A nostalgia musical nos ajuda a construir e manter um senso de identidade coerente, reconectando-nos com quem éramos e com os valores que nos moldaram [6]. Ou seja, a música funciona como ferramenta e atributo da nossa identidade.Podemos usar a nostalgia musical de forma consciente para regular nossas emoções, “hackeando” o nosso sistema, para, por exemplo, aumentar o nosso bem-estar e até mesmo melhorar o desempenho cognitivo [7]. Um outro ponto é que há uma validação legítima da nossa nostalgia quanto ao nosso sistema de preferências. A sensação de que "a música antiga era melhor" não é apenas saudosismo, mas sim, uma resposta neurológica real, comprovada pelo estudo de Levitin, especialmente por essa correlação marcante entre as experiências musicais vividas no nosso período de adolecência [8].
Implicações da música como ferramenta de modelagem do caráter
As descobertas de Levitin nos alertam para o poder da música na formação do caráter, especialmente na vida de nossos filhos. A música não é apenas entretenimento, mas uma ferramenta poderosa que pode moldar seus valores, crenças e comportamentos. Um exercício interessante que podemos fazer é o seguinte: imagine todas as pessoas que você conhece e as correlacione com suas preferências musicais. Você observará um padrão que poderá não apenas classificá-lo quanto a seus gostos na perspectiva do entretenimento, mas também, características de personalidades e constructos de valores. A complexidade das melodias, profundidade das letras, ideais expressados nas canções, todos eles, de alguma forma, comungam com nossas preferências e, acima de tudo, nossos valores. Não são apenas escolhas arbitrárias de um final de semana despretensioso entre amigos.Descobertas como essa apontam a importância do nosso papel como pais e como esse aspecto – a música, até então, costumeiramente vista como entretenimento, e nossas preferências, como casualidade e resultados aleatórios do destino, podem permear características mais profundas da nossa personalidade. Estudos como esse revelam um atributo adicional da nossa responsabilidade de guiar nossos filhos na escolha das músicas que consomem, dado que elas podem – e, eventualmente irão – influenciar sua visão de mundo e seus valores.
A música pode ser usada como uma ferramenta educacional poderosa, transmitindo valores positivos, ensinando sobre história e cultura, e promovendo o desenvolvimento emocional e social. Expor nossos filhos a uma variedade de gêneros musicais pode ampliar seus horizontes, estimular sua criatividade e promover a tolerância e o respeito pela diversidade cultural. As músicas que nossos filhos ouvem hoje, por outro lado, serão as trilhas sonoras de suas vidas, moldando suas memórias e influenciando suas emoções no futuro. Ao compreendermos o poder da nostalgia musical, podemos usar essa ferramenta de forma consciente e responsável, guiando nossos filhos na construção de um futuro mais positivo e significativo.
Referências
[1] Levitin, D. J. (2006). This is your brain on music: The science of a human obsession. Dutton.[2] Janata, P. (2009). The neural architecture of music-evoked autobiographical memories. Annals of the New York Academy of Sciences, 1169(1), 193-198.
[3] Krumhansl, C. L. (2011). An exploratory study of musical memories and emotions across the lifespan. Psychology of Music, 39(3), 339-363.
[4] Lamont, A. (2011). Musical identities in adolescence. In Musical identities (pp. 71-88). Oxford University Press.
[5] Juslin, P. N., & Västfjäll, D. (2008). Emotional responses to music: The need to consider underlying mechanisms. Behavioral and brain sciences, 31(5), 1 559-575.
[6] Wildschut, T., Sedikides, C., Routledge, C., Arndt, J., & Cordaro, F. (2010). Nostalgia as a repository of social connectedness: The nature, determinants, and consequences of feeling homesick. Journal of personality and social psychology, 98(4), 573.
[7] Barrett, L. F. (2017). How emotions are made: The secret life of the brain. Houghton Mifflin Harcourt.
[8] Schulkind, M. D., & Wakkary, R. (2011). Music, emotion, and autobiographical memory: Are musical memories special?. Psychology of Music, 39(3), 317-338.
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