Gestão de Produtos: Equilibrando o Possível, Viável e Desejável
Visão geral
Depois de quase 22 anos de carreira atuando majoritariamente em times de tecnologia e engenharia, estou passando por uma fase super empolgante, mas igualmente desafiadora: estou trabalhando, juntamente com nosso time, para transformar a nossa empresa, que é focada principalmente em serviços, a também sermos uma empresa de produtos. Isso significa que, além de continuar oferecendo serviços de consultoria em Computação em Nuvem, estamos trabalhando em desenvolver nossos próprios produtos e levá-los ao mercado.Naturalmente, essa mudança não é trivial. Estamos lidando com a tarefa de criar um novo modelo de negócios, ajustarmos a mentalidade da equipe, que está acostumada com o modelo de serviços, para começar a pensar como desenvolvedores de produtos. Isso envolve novas formas de trabalhar, mais colaboração e muita experimentação para criar algo que realmente faça diferença para nossos clientes.
Esse tipo de desafio é bem comum para empresas que, como a Valcann, buscam diversificar e entrar em novos mercados. Muitas vezes, o maior obstáculo é descobrir qual produto desenvolver e garantir que ele realmente resolva um problema importante para os clientes. Para nós, que trabalhamos com serviços de consultoria, problema é o que não falta!
Então, temos buscado na nossa própria realidade, os desafios que valem a pena serem resolvidos com produtos. Mas não só isso: também precisamos ajustar toda a nossa estrutura interna para apoiar essa nova direção. Isso inclui investir em pesquisa, criar protótipos, testar rapidamente, ouvir o feedback dos clientes e ajustar o produto com agilidade... Tudo isso com a ampulheta da rúbrica de “Investimentos” virada. É um caminho que exige paciência e flexibilidade, mas ao mesmo tempo, muita responsabilidade e paixão pelo problema e menos pela solução — afinal, podemos precisar abandoná-la e buscar outra, quando essa não resolve o desafio que identificamos.
É aí que a gestão de produtos tem entrado como peça-chave. Com ela, temos conseguido alinhar nossos objetivos com as necessidades e as habilidades da nossa equipe. Em nosso dia a dia, temos aplicando práticas como validação contínua, priorização de funcionalidades e desenvolvimento iterativo, para garantir que nossos produtos sejam realmente desejados pelos clientes e viáveis para a empresa.
Mas, quais são os desafios que temos enfrentado?
No desenvolvimento de produtos, especialmente em ambientes de alta competitividade e inovação como da Computação em Nuvem, encontrar o equilíbrio certo entre o que é possível, viável e desejável é possivelmente o principal desafio. E isso não tem sido diferente para o que estamos enfrentando em nossa célula de desenvolvimento de produtos na Valcann.

O Que Significam “Possível”, “Viável” e “Desejável”?
Possível (Engenharia): Este elemento trata a viabilidade técnica de um produto ou recurso. A questão central aqui é: “Podemos construir isso?” Envolve a análise das capacidades tecnológicas e da equipe, além de considerar limitações como tempo, recursos e complexidade técnica. A equipe de engenharia precisa garantir que o produto seja construído de forma eficiente, sustentável e escalável.
Viável (Gestão de Produto): Trata-se da viabilidade de negócios. Aqui, a questão é: “Devemos construir isso?” Envolve avaliar se o produto ou recurso faz sentido economicamente e estrategicamente para o negócio. Considerações como custo, potencial de receita, mercado-alvo e alinhamento estratégico são fundamentais. A gestão de produto precisa assegurar que o desenvolvimento traga um retorno sobre o investimento (ROI) positivo.
Desejável (UX — User Experience): Aqui avaliamos a atratividade e usabilidade do produto para os usuários finais. A pergunta que guia esta área é: “Os usuários querem isso?” Envolve entender profundamente as necessidades e desejos dos usuários, garantindo que o produto seja não apenas utilizável, mas também desejável. A equipe de UX realiza pesquisas, cria protótipos e conduz testes de usabilidade para validar essas hipóteses.
A interseção desses três círculos representa o “sweet spot” na gestão de produtos — o ponto onde o produto atende aos requisitos técnicos, de negócio e do usuário. É aqui que reside o maior potencial de sucesso.
Discovery e Delivery: Fazendo acontecer
Quando falamos em “fazer acontecer” em desenvolvimento de produtos, há um conceito essencial que é o conceito de Dual Track.
O Dual Track é uma abordagem de desenvolvimento de produtos que divide o trabalho em duas trilhas paralelas: Discovery (Descoberta) e Delivery (Entrega). A ideia principal por trás do Dual Track é que, em vez de tratar a descoberta e a entrega como fases sequenciais, essas atividades acontecem ao mesmo tempo, permitindo que as equipes sejam mais ágeis e respondam rapidamente a mudanças e novas informações.

Na trilha de Discovery, o foco é entender profundamente o problema que precisa ser resolvido, explorar as necessidades dos usuários e identificar soluções possíveis. Aqui, a equipe está testando ideias, criando protótipos, realizando pesquisas com usuários e validando hipóteses. O objetivo é garantir que o que está sendo planejado para ser construído é realmente desejado pelos usuários e vai atender às necessidades de negócios. É uma fase de muita experimentação, onde as falhas são bem-vindas porque ajudam a aprender rapidamente o que funciona e o que não funciona.
Enquanto isso, na trilha de Delivery, a equipe está ocupada transformando essas ideias validadas em um produto funcional. Aqui, o foco é a execução eficiente: construir, testar e lançar o produto com qualidade e dentro do prazo e orçamento. A beleza do Dual Track é que essas duas trilhas estão sempre alimentando uma à outra. As descobertas feitas na trilha de Discovery informam e ajustam o trabalho de Delivery, enquanto o feedback da entrega pode trazer novas questões ou ideias de volta para a fase de Discovery. Essa abordagem integrada permite que as equipes de produto sejam mais dinâmicas e capazes de adaptar suas estratégias rapidamente, garantindo que o produto final seja algo que os usuários realmente queiram e precisem.
Essa abordagem tem sido fundamental para nós, nos ajudando a sempre ter nossa equipe atuando de forma integrada, desde o design, engenharia à gestão de produto (tanto quanto ao roadmap original, como quanto às novas demandas e funcionalidades que surgem na medida em que vamos entregando o software).
E os desafios?
Implementar esses conceitos de forma integrada não é simples e vem com uma série de desafios. Primeiro, temos a necessidade do alinhamento entre as equipes. Para que tudo funcione bem, os times Design, Engenharia e Gestão de Produto precisam estar na mesma página, compartilhando informações e trabalhando juntos em direção aos mesmos objetivos. Isso exige uma comunicação constante, rotina — dailys, weeklys e quantas cerimônias forem necessárias — além de uma boa dose de colaboração para garantir que ninguém fique para trás e que todos estejam na mesma direção.
Há também o desafio comum em contextos de engenharia: priorização de recursos. Com tempo e dinheiro sempre limitados, decidir onde investir pode ser uma tarefa complicada. É preciso negociar bastante e manter o foco naquilo que realmente traz mais valor para o produto e para o usuário final.
Também temos buscado sermos adaptáveis às mudanças de mercado, já que o que é importante hoje pode não ser mais amanhã. Temos buscado que nossas equipes sejam ágeis e estejam prontas para mudar de direção caso novas evidências apareçam. E, claro, não podemos esquecer do foco contínuo no usuário: no final das contas, mesmo que o produto seja tecnicamente viável e economicamente possível, ele só vai ter sucesso se for algo que os usuários realmente queiram e precisem. Manter sempre o usuário no centro das decisões é crucial para garantir que o produto tenha um impacto positivo.
E o que funciona?
Depois desse tempo, por outro lado, tenho observado que alguns pontos são essenciais e funcionam bem para apoiar na gestão de produtos. Primeiramente, conhecer e adotar uma abordagem ágil é fundamental. Metodologias como Scrum tem uma profunda conexão com a realidade inerente de desenvolvimento de produtos inovadores, permitindo iterações rápidas e feedback contínuo — tanto entre o time, como com os usuários — o que facilita fazer ajustes ao longo do desenvolvimento do produto. Isso ajuda a manter o projeto no caminho certo e permite que as equipes respondam rapidamente às mudanças e novas informações.
Outro aspecto que tem se mostrado importante é promover a colaboração interdisciplinar. Criar um ambiente onde o time de desig, engenharia e gestão de produto trabalhem juntos desde o início é essencial. Isso ajuda a compartilhar ideias e reflexões, alinhar metas, entre outros aspectos, o que ajuda que todos estejam trabalhando em harmonia.
Também é fundamental realizar continuamente a avaliação da demanda dos usuários e o mercado para manter o produto relevante e alinhado com as necessidades dos usuários e as tendências de mercado. A entropia, especialmente em um contexto como o nosso, de Computação em Nuvem, é gigantesca. Tudo muda muito rápido. Novos produtos são lançados, novos problemas são criados. Então, é fundamental que continuamente nós possamos entender o que está acontecendo.
Investir em prototipagem e testes de usabilidade também é um ponto que tem se mostrado importante. Ele permite testar conceitos antes de nos comprometermos com o desenvolvimento completo, garantindo que as soluções sejam não apenas tecnicamente viáveis, mas também desejáveis e fáceis de usar para os usuários.
E por fim, um dos pontos que ainda estamos evoluindo, mas que tenho refletido muito sobre sobre a necessidade de priorizá-lo, é a definição de KPIs claros que alinhem os objetivos técnicos, de negócios e de experiência do usuário. Essa abordagem pode ser vital para manter o foco nas metas certas e assegurar, de forma objetiva, que estamos atingindo o que buscamos.
É um desafio grande, diferente de tudo que enfrentamos até agora nos últimos 10 anos. Mas, a motivação é a mesma de quando começamos, especialmente considerando o time com quem tenho o prazer de dividir essa jornada. Ainda que um time jovem — tirando esse que vos escreve, naturalmente — vejo um grupo de pessoas extremamente competentes, dedicadas e, acima de tudo, apaixonadas pelo problema que estamos buscando resolver. Sem dúvida, é essa experiência como time que tem tornado esse desafio em algo prazeroso e motivador.
Referências
[1] C. D. C. P., "Gestão de Produtos: Equilibrando o Possível, Viável e Desejável," Blog. Disponível em: https://www.cdiego.com. Acesso em: 2 set. 2024.
[2] J. Gothelf, Lean UX: Applying Lean Principles to Improve User Experience. Sebastopol: O’Reilly Media, 2013.
[3] T. Brown, Change by Design: How Design Thinking Creates New Alternatives for Business and Society. Nova York: Harper Business, 2009.
[4] H. Kniberg, Scrum and XP from the Trenches. 2nd ed. Estocolmo: C4Media, 2015.
[5] R. P. Feynman, O Fantástico Sr. Feynman. Documentário. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=BHoPO4qrRGA. Acesso em: 2 set. 2024.
[6] J. Sutherland, Scrum: A Arte de Fazer o Dobro do Trabalho na Metade do Tempo. 1ª ed. Rio de Janeiro: Sextante, 2014.
[7] J. Cagan, Inspired: How to Create Products Customers Love. 2nd ed. Hoboken: Wiley, 2017.
[8] E. Ries, The Lean Startup: How Today's Entrepreneurs Use Continuous Innovation to Create Radically Successful Businesses. Nova York: Crown Business, 2011.
[9] D. Dunning e J. Kruger, "Unskilled and unaware of it: how difficulties in recognizing one’s own incompetence lead to inflated self-assessments," Journal of Personality and Social Psychology, vol. 77, no. 6, pp. 1121–1134, 1999. DOI: 10.1037/0022-3514.77.6.1121.
[10] D. Banfield, C. Lombardo e T. Wax, Design a Better Business: New Tools, Skills, and Mindset for Strategy and Innovation. Hoboken: Wiley, 2016.
Comentários
Postar um comentário